Por Rafaela Lucena, sócia da área de Soluções em RH da Bernhoeft
Muito se fala sobre cultura organizacional como ativo estratégico, mas pouco se debate sobre o protagonismo da liderança nesse processo. Em tempos de mudanças rápidas e instabilidade, líderes que ignoram o impacto de suas ações — ou omissões — na cultura interna de suas organizações, inevitavelmente comprometem resultados, engajamento e inovação.
Cultura não é o que está escrito nas paredes ou em manuais corporativos. É o que se pratica nos corredores — presenciais ou virtuais. É como as decisões são tomadas, como se reconhece (ou não) as pessoas, e, principalmente, como a liderança se comporta. Os líderes são os principais embaixadores da cultura. Quando suas atitudes não refletem os valores que pregam, a organização vive um descompasso difícil de reparar.
Como cobrar engajamento de uma equipe que vê seus líderes agirem de forma incoerente com os valores da empresa?
Garantir que a cultura esteja enraizada no cotidiano exige intencionalidade. Isso se expressa em decisões de negócios, alocação de recursos, rituais de reconhecimento e até na forma como a empresa conduz demissões. Um desligamento feito com respeito e empatia comunica tanto quanto um onboarding bem estruturado. Ambos revelam — ou contradizem — os valores da empresa.
Um exemplo simples, mas poderoso, é a criação de espaços recorrentes para reconhecer atitudes alinhadas à cultura. Quando líderes promovem encontros com pequenos grupos para ouvir conquistas e experiências conectadas aos valores organizacionais, fortalecem o senso de pertencimento de forma real. É nesses ritos, muitas vezes invisíveis para fora, que a cultura acontece de fato.
Os desafios, claro, são muitos. Resistência à mudança, falhas na comunicação e a falta de clareza sobre o que realmente se espera de todos são obstáculos frequentes. Superá-los exige escuta ativa, consistência e disposição para cocriar. A cultura organizacional precisa ser revisada com frequência para continuar viva, coerente e relevante — sob o risco de virar ruído ou formalidade.
Longe de ser um conceito abstrato, cultura forte é fator real de competitividade. Impacta diretamente na retenção de talentos, no senso de pertencimento, na produtividade e na capacidade de inovar. Estudo da Gallup mostra que empresas com líderes engajados em suas práticas culturais apresentam maior lucratividade. Já a Gartner destaca que ambientes com cultura sólida têm desempenho superior em inovação e resposta às mudanças do mercado.
Nos modelos híbridos e remotos, o desafio é ainda maior. A ausência física não enfraquece uma cultura que é clara, coerente e vivida nas interações. Os rituais precisam ser ressignificados, as lideranças preparadas, e a comunicação precisa ir além do funcional — precisa ser humana.
Olhando para frente, é impossível falar de cultura organizacional sem considerar tendências como diversidade, bem-estar, transformação digital e o uso ético da inteligência artificial. O papel da liderança é articular essas frentes com coerência, criando um ambiente onde as pessoas possam ser quem são — e dar o seu melhor.
Em tempos de tanta disrupção, é essencial saber o que permanece inegociável. Uma empresa que conhece e vive seus valores não apenas sobrevive às transformações — ela cresce com elas. E esse crescimento começa, inevitavelmente, pela forma como a liderança se posiciona e inspira.
No fim, a pergunta que toda liderança precisa se fazer é: estamos realmente vivendo os valores que queremos ver em nossa organização?
Sobre Rafaela Lucena
Rafaela Lucena atualmente é Coach Executivo e Mentora de Carreira. Com 15 anos de experiência em Recursos Humanos, liderou a implantação desta área em uma empresa nacional e promoveu mudanças estratégicas significativas, incluindo a disseminação do manifesto de cultura da Bernhoeft e o reposicionamento do RH como uma função estratégica. Atualmente, está como sócia responsável da área de soluções em RH da empresa.