O mercado brasileiro de vale-refeição (VR) e vale-alimentação (VA) movimenta cerca de R$ 150 bilhões por ano, representando um importante componente da economia voltado à alimentação dos trabalhadores. No entanto, o setor enfrenta críticas crescentes quanto às altas taxas de desconto, conhecidas como MDR (Merchant Discount Rate), que podem ultrapassar 7% nas transações realizadas em bares, restaurantes e supermercados. Diante da pressão por redução desses custos — que impactam diretamente os preços ao consumidor e a saúde financeira dos estabelecimentos — o governo federal avalia impor um teto para essas taxas, possivelmente fixado em torno de 3,5%, em um movimento que pode alterar profundamente a dinâmica do setor.
A regulação do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em conjunto com o Ministério da Fazenda, é o foco das negociações em curso. Entidades que representam as operadoras do setor, como a Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT) e a Câmara Brasileira de Benefícios ao Trabalhador (CBBT), propõem não apenas a limitação das taxas, mas também a redução do prazo para repasse dos valores aos lojistas — que atualmente pode chegar a até 30 dias. Essa combinação de altos custos e atrasos tem impacto significativo, especialmente para pequenos negócios que operam com margens apertadas e dependem de liquidez imediata para se manterem.
No entanto, o debate sobre a redução das taxas não é simples. As empresas que operam os chamados “arranjos fechados” argumentam que as taxas mais elevadas refletem os custos adicionais com fiscalização e credenciamento de estabelecimentos, necessários para garantir o cumprimento das regras do PAT, como a proibição da venda de bebidas alcoólicas com esses cartões. Já as companhias que atuam em “arranjos abertos”, semelhantes ao mercado tradicional de cartões, adotam estruturas e taxas diferentes, o que dificulta a padronização das regras e a formação de um consenso regulatório.
“Hoje, as taxas são elevadas e os prazos de repasse muitas vezes inviáveis, o que limita o acesso de quem mais precisa. Já existe um movimento no mercado para mudar esse cenário, mas uma legislação pode acelerar essa transformação. A regulação é bem-vinda porque traz segurança e equilíbrio — melhora a experiência para quem recebe o benefício e também para quem opera o sistema”, afirma Andre Purri, CEO da Alymente.
A pressão sobre o setor aumentou com a alta dos preços dos alimentos, que afetou diretamente o custo operacional dos estabelecimentos. A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) denunciou que, somadas a outras tarifas — como antecipação e administração —, as taxas podem chegar a até 15% do valor das vendas, o que acaba sendo repassado ao consumidor final. Em resposta, a Abras propôs que o governo assuma diretamente a operação do PAT, eliminando intermediários e promovendo uma economia estimada em R$ 10 bilhões por ano. A proposta, no entanto, enfrenta resistência das empresas do setor, que ressaltam a importância de sua atuação para prevenir fraudes e assegurar a correta aplicação dos benefícios.
Em meio a um cenário fiscal delicado, marcado por pressões para corte de gastos e controle das contas públicas, a definição das novas regras do setor tem sido postergada. Uma reunião agendada para o fim de junho, que reunirá representantes do governo, operadoras, lojistas e outras partes interessadas, será decisiva para o futuro do VR e VA no país. O principal desafio será encontrar um equilíbrio entre a redução das taxas, a sustentabilidade financeira das operadoras e a garantia de um ambiente competitivo e justo — considerando a relevância social e econômica do programa para milhões de trabalhadores brasileiros.