
*Paulo Akiyama
Ao reler antigas anotações sobre a Aliança para o Progresso e a campanha “Doe ouro para o bem do Brasil” utilizados em um artigo que publiquei em 2015, revivo a percepção de que o país caminha por uma estrada cíclica — marcada por avanços pontuais e obstáculos reincidentes. A memória histórica, quando confrontada com o cenário atual, revela mais que paralelos: revela padrões. O Brasil de 2025 carrega ainda muitas das fragilidades que atravessaram décadas anteriores, mas também apresenta oportunidades que exigem leitura atenta do passado para pavimentar caminhos mais sólidos tendo como destino o futuro.
Crises que se repetem e aprendizados que custam caro
A proposta da Aliança para o Progresso, lançada por John Kennedy em 1961 para conter o avanço do comunismo na América Latina por meio de apoio econômico e institucional, perdeu fôlego com a morte do presidente e o endurecimento dos regimes militares. No Brasil, a ditadura iniciada em 1964 impôs repressão política e violação de direitos, ao mesmo tempo em que enfrentava inflação, dívida externa e choques internacionais como o do petróleo. A redemocratização trouxe esperança, mas também revelou os limites das estruturas institucionais: a estabilidade econômica era uma promessa sempre adiada, especialmente diante das crises fiscais e dos episódios traumáticos dos anos 80 e 90, como o confisco da poupança e a hiperinflação.
O Plano Real, em 1994, representou um divisor de águas ao estabilizar a moeda e conter a inflação. Ainda assim, os governos subsequentes navegaram na onda do sucesso inicial do plano, mas encontrando turbulências no caminho, ora diante de escândalos de corrupção, ora enfrentando desaceleração econômica e pressões sociais. A Operação Lava Jato escancarou as entranhas do sistema político brasileiro, mas também deixou um rastro de desgaste institucional e resultou, ao longo do tempo, em mais uma insegurança jurídica, além de provocar a polarização entre a esquerda e a direita que persiste até hoje.
A encruzilhada de 2025: avanços tímidos e velhas urgências
O cenário atual não é de colapso, mas tampouco é de estabilidade. A economia brasileira apresenta crescimento modesto, com o PIB projetado em torno de 2%, segundo organismos internacionais. A inflação segue acima da meta, impulsionada por fatores externos e internos, enquanto os juros altos impactam o consumo e travam investimentos. A taxa básica está em 15%, um patamar que não se via há quase vinte anos.
Mais preocupante que os números é o sentimento de estagnação institucional. O Brasil caiu para a 107ª posição no Índice de Percepção da Corrupção da Transparência Internacional, evidência de que os mecanismos de controle ainda não foram capazes de consolidar uma cultura pública pautada pela ética e pela eficiência. A prisão recente de figuras históricas da política nacional, como o ex-presidente Fernando Collor, não foi suficiente para restaurar a confiança da população nas instituições.
A desigualdade social permanece como um dos grandes entraves ao progresso. Mesmo com avanços em programas de transferência de renda, a concentração de riqueza, a precariedade nos serviços básicos e a dificuldade de acesso à educação de qualidade mantêm milhões de brasileiros à margem de oportunidades reais de mobilidade social.
Tecnologia, inovação e os caminhos possíveis
Se há uma luz no horizonte, ela vem da inovação. O Brasil desponta como um polo importante em setores estratégicos como energia renovável, agronegócio sustentável e tecnologia da informação. Startups e centros de pesquisa ganham fôlego com apoio de iniciativas privadas e, pontualmente, de políticas públicas que incentivam desenvolvimento e internacionalização.
A digitalização de serviços públicos também evoluiu — impulsionada durante a pandemia —, e hoje representa um dos poucos exemplos de eficiência estatal. Ainda assim, a burocracia, a insegurança jurídica e o custo Brasil seguem travando o pleno desenvolvimento. A infraestrutura física, por sua vez, continua defasada. Faltam investimentos estruturantes em transporte, saneamento e energia que acompanhem a pujança de setores mais modernos da economia.
O que ainda falta ser feito
A história mostra que não basta esperar que o tempo resolva. Reformas estruturais continuam empacadas — a tributária foi parcialmente aprovada, mas carece de regulamentação eficiente. A administrativa sequer avançou. O sistema político, ainda moldado por interesses de curto prazo, falha em construir uma visão de país que vá além do ciclo eleitoral.
É urgente investir em educação, inovação e sustentabilidade. Preparar novas gerações para os desafios do século XXI exige mais que recursos: exige prioridade. Conciliar crescimento econômico com proteção ambiental não pode mais ser tratado como antagonismo, mas como oportunidade. A Amazônia continua sendo um ativo estratégico negligenciado, explorado à margem da legalidade e da lógica sustentável.
O Brasil de 2025 é um país em disputa. Entre promessas e retrocessos, entre inércia e reinvenção, o que se impõe é a necessidade de amadurecimento institucional. Isso passa por reformas, por educação de base sólida, por estímulo à inovação e, acima de tudo, por uma cultura pública que valorize o coletivo, o diálogo e o compromisso de longo prazo.
Se o passado serviu de alerta, que o presente sirva de escolha. Não se trata apenas de resistir às crises, mas de aprender com elas para finalmente superá-las — de forma estrutural, justa e duradoura.