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Especialista analisa o impacto do julgamento do STF que discutirá a pejotização e alerta: “O desafio é separar o verdadeiro trabalho autônomo do funcionário disfarçado de PJ”

A decisão que o Supremo Tribunal Federal (STF) deve tomar sobre a pejotização – modelo em que empresas contratam profissionais como pessoas jurídicas – tem potencial para redefinir as bases do mercado de trabalho no Brasil. O julgamento do Tema de Repercussão Geral 1389 deverá estabelecer os critérios que diferenciam o trabalho com autonomia do vínculo empregatício disfarçado, com efeitos diretos sobre empresas, trabalhadores e a Previdência Social.

“O STF tem agora a oportunidade de traçar uma linha divisória entre a liberdade contratual legítima e a fraude trabalhista”, afirma o advogado Gilson Souza Silva, especialista em Direito do Trabalho e sócio do Comparato, Nunes, Federici &Pimentel Advogados (CNFLaw) na área trabalhista. Segundo ele, a discussão vai além da forma contratual: “A questão central é saber se o profissional é, de fato, um prestador de serviços autônomo ou um empregado contratado sob outra forma”.

A pejotização, explica Gilson, ocorre quando uma pessoa é contratada via CNPJ para prestar serviços. O problema surge quando o contrato é usado apenas para mascarar uma relação típica de emprego. “A Justiça do Trabalho aplica o princípio da primazia da realidade, que significa que o que vale é a prática e não o contrato”, pontua.

Para identificar a fraude, os juízes observam quatro requisitos da CLT: pessoalidade, habitualidade, onerosidade e subordinação. “Se todos esses elementos estão presentes, ainda que o profissional tenha um CNPJ, a relação é de emprego e a empresa será condenada a pagar todos os direitos trabalhistas em uma eventual ação”, explica.

De acordo com o advogado, o critério-chave é a autonomia. “Quando o profissional define seus horários, usa seus próprios meios de trabalho e atende a vários clientes, há autonomia. Mas se ele cumpre ordens, metas, horários e depende economicamente de um único contratante, é um empregado disfarçado”, destaca.

Gilson Souza Silva afirma que o julgamento do STF pode trazer segurança jurídica e uniformizar entendimentos. “Hoje o cenário é caótico. Cada juiz tem uma visão diferente sobre o que caracteriza vínculo. A decisão do Supremo será o marco que o país precisa para distinguir o legítimo empreendedor individual da fraude que precariza o trabalho”, avalia.

O especialista alerta, no entanto, que uma decisão muito restritiva pode gerar impacto econômico expressivo. “Setores como tecnologia, comunicação, saúde e consultoria são os que mais utilizam a contratação PJ. Se o STF endurecer demais as regras, haverá aumento da folha de pagamento, passivos trabalhistas retroativos e reestruturações em massa”, explica.

Por outro lado, uma tese muito permissiva pode abrir espaço para abusos. “A pejotização não pode se tornar uma forma de retirar do trabalhador os direitos básicos de férias, 13º e FGTS. O equilíbrio é essencial”, afirma Gilson Souza Silva.

O advogado reforça que o modelo PJ pode coexistir com a CLT, desde que usado corretamente. “A contratação por pessoa jurídica é saudável quando reflete uma relação de autonomia real. O problema não está no modelo, mas no mau uso que se faz dele para mascarar vínculos”, avalia.

Para as empresas, o recado é claro: autonomia na prática, e não apenas no papel, diz o especialista. “Não adianta ter um contrato PJ se, na rotina, há subordinação, controle de jornada e exclusividade. Isso é fraude e será reconhecido como tal pela Justiça”, alerta.

E conclui: “A CLT de 1943 não pode ser o obstáculo que impede o país de avançar. O Supremo precisa estabelecer parâmetros que protejam o trabalhador sem inviabilizar a inovação nas relações de trabalho”.

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