*Adriana Melo
Entrou em vigor a nova medida dos Estados Unidos que impõe uma sobretaxa de 50% sobre quase 4 mil produtos brasileiros. A decisão, anunciada por Donald Trump, impacta diretamente alimentos, produtos de higiene, químicos e industriais, reacendendo uma tensão comercial com consequências práticas para empresas brasileiras que exportam para o mercado norte-americano.
Apesar das exceções previstas, o tarifaço representa um risco real para a competitividade brasileira. Em um primeiro momento, podemos esperar queda no volume exportado, aumento dos preços e impactos diretos nas margens das empresas que dependem desse canal. Mas a dimensão mais relevante do problema é estratégica: o Brasil segue com um perfil comercial excessivamente concentrado em poucos mercados, e sem um plano claro de resposta quando esses mercados se tornam hostis.Não é a primeira vez que o mundo nos dá esse recado e talvez por isso devêssemos escutar com mais atenção agora.
A medida dos EUA fecha, temporariamente, uma porta. Mas não o mundo. A China, por exemplo, ainda engatinha no consumo de café: são apenas 16 xícaras por pessoa ao ano, contra uma média global de 240. Isso significa que há um oceano de oportunidades inexploradas. O mesmo vale para a carne, a celulose, o papel, os calçados e tudo o que o Brasil sabe plantar, criar e transformar.
A União Europeia, o Japão e até os vizinhos do Mercosul continuam com apetite. E a boa notícia é que, diferentemente do que acontece com os EUA, muitos desses mercados valorizam atributos como sustentabilidade, rastreabilidade e práticas ESG áreas nas quais as empresas brasileiras têm avançado nos últimos anos.
Mas o tarifaço é, acima de tudo, um sinal para mudar o mapa. Literalmente. Não dá para continuar vendendo somente para os mesmos mercados por pura inércia. A ideia de “cliente cativo” não existe mais em uma economia global marcada por volatilidade política e rupturas comerciais.
É hora de traçar novas rotas, diversificar destinos, proteger nossas cadeias e ampliar acordos bilaterais. É hora de escolher mercados que pagam bem, que respeitam regras, e que querem mais do que apenas preço. E também, claro, manter parte dessa produção aqui dentro, fomentando consumo interno e protegendo o país de choques externos.
A resposta ao tarifaço não está apenas em reagir, mas em evoluir. Evoluir como empresas, como governo, como país exportador.
*Adriana Melo, especialista em finanças e planejamento estratégico, com experiência em empresas como Fiat, Votorantim e SAS. Pode analisar os impactos diretos para empresas exportadoras e estratégias de adaptação a cenários de risco internacional.