A partir de 6 de agosto de 2025, entram em vigor novas tarifas de 50% sobre produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos. A medida, confirmada pelo presidente Donald Trump, já gera incertezas no setor produtivo brasileiro, com previsões de que muitas micro e pequenas empresas (MPEs) serão expulsas das cadeias internacionais de exportação. Esta nova tarifa se soma à já existente de 10%, resultando em um impacto potencial em setores chave da economia brasileira.
Joseph Couri, presidente do SIMPI Nacional (Sindicato da Micro e Pequena Indústria), afirma que o risco vai além da competitividade: “Se a tarifa de 50% se mantiver, o Brasil deixará de ser competitivo. O importador vai buscar alternativas em outros países com tarifas médias de 15%. Somente continuarão comprando de nós onde não há opções, e mesmo assim com volume restrito.”
O risco, segundo ele, não está apenas na perda de receita: há um ciclo de efeitos em cadeia que já começa a ser sentido com antecipação de férias, demissões, cancelamentos de pedidos e ruptura de contratos internacionais. “É um cenário de guerra tarifária, e os pequenos negócios são os primeiros a cair”, enfatiza.

Com as novas tarifas, o cenário é crítico para muitos setores. Mesmo com um alívio para 44,6% das exportações brasileiras que estarão isentas da tarifa de 50%, 35,9% da pauta exportadora será diretamente atingida pela tarifa, e 19,5% continuará sob tarifas globais. As micro e pequenas empresas precisam agir agora para garantir sua sobrevivência no mercado internacional, enquanto buscam novos mercados e revisam seus modelos de operação.
Três cenários possíveis para MPEs exportadoras diante do tarifaço
Na avaliação do presidente do SIMPI, o novo cenário coloca as micro e pequenas empresas exportadoras em um momento de encruzilhada. Não há espaço para inércia. A partir de agora, três realidades distintas começam a se desenhar para os exportadores de menor porte:
Negociar para sobreviver
Algumas empresas estão conseguindo renegociar com seus parceiros comerciais nos EUA, dividindo o impacto da nova tarifa. Em setores como o de geleias e chocolates artesanais da Amazônia, parte do custo está sendo absorvido pelo importador. “Nesses casos, o relacionamento comercial construído com solidez ao longo dos anos faz diferença. Há abertura para diálogo e adaptação”, explica Couri.
Assumir o prejuízo sozinho
Outras empresas, especialmente as que dependem fortemente das exportações, estão sendo forçadas a absorver sozinhas o custo da tarifa para não perder mercado. Essa decisão, porém, compromete margens, afeta o capital de giro e coloca a sustentabilidade do negócio em risco. “É uma solução de curto prazo para manter o cliente, mas que pode se tornar insustentável em poucos meses”, alerta.
Ser excluído do jogo internacional
O cenário mais crítico é o do cancelamento puro e simples de pedidos. Importadores, pressionados por custos mais altos e com outras opções no mercado global, já começam a suspender contratos com empresas brasileiras. “A empresa que não se antecipar com negociações poderá simplesmente ser trocada por um concorrente de outro país”, afirma Couri.
Diante desse quadro, ele reforça: esperar por uma solução diplomática futura é uma aposta de alto risco. “O empresário precisa proteger seus contratos, conversar com seus compradores e explorar novos mercados enquanto ainda há tempo. Não adianta esperar medidas governamentais que venham depois do estrago.”
O que as micro e pequenas empresas podem (e devem) fazer agora
Diante da entrada em vigor do tarifaço, o SIMPI propõe um conjunto de medidas imediatas que podem ajudar micro e pequenas indústrias a mitigar os impactos, proteger seus contratos e reposicionar sua produção. As ações exigem iniciativa e pragmatismo, e podem representar a diferença entre sobreviver ou sair do mercado internacional.
Negociar com inteligência os contratos em curso
A orientação é iniciar diálogos diretos com os clientes nos Estados Unidos, propondo a divisão dos custos tarifários. Esse tipo de cooperação pode manter os pedidos em andamento até que o mercado se reequilibre.
Revisar cláusulas, prazos e volumes
O SIMPI recomenda que empresas revisem imediatamente cláusulas contratuais, prazos de entrega e volumes negociados, evitando o rompimento de contratos ou penalizações por descumprimento.
Buscar mercados com menor barreira tarifária
América Latina, Ásia e África são alternativas viáveis, com menores tarifas e acordos mais favoráveis. A diversificação de mercados pode reduzir a dependência dos EUA.
Redirecionar parte da produção para o mercado interno
Diante do câmbio elevado, o consumo interno se torna mais atrativo. Parcerias com marketplaces, redes varejistas e canais digitais podem absorver parte da produção ociosa.
Aproveitar acordos regionais como o Mercosul
Países do bloco regional oferecem maior previsibilidade e menor risco tarifário, o que pode ser estratégico no curto prazo.
Essas estratégias, segundo Couri, não garantem estabilidade imediata, mas podem preservar relações comerciais e manter o fluxo produtivo. “Neste momento, o empresário precisa olhar para fora da crise e proteger seus ativos: clientes, produção, contratos e reputação. Quem agir agora terá mais chances de permanecer no mercado quando o cenário voltar a se estabilizar.”
Apesar de representarem cerca de 1% das exportações totais do Brasil, as micro e pequenas indústrias têm papel fundamental nas cadeias de fornecimento de grandes empresas. E, justamente por isso, seus prejuízos podem ser multiplicadores em toda a cadeia produtiva.
“A guerra comercial imposta pelos EUA é injusta, e todos perdem com ela. Mas o pequeno empresário não pode se dar ao luxo de esperar: quem sobreviver será aquele que souber proteger seus contratos e seus relacionamentos comerciais”, conclui Couri.
Taxar big techs
O governo federal estuda criar uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) de 3% sobre serviços de publicidade digital das grandes plataformas estrangeiras, como parte da negociação para tentar reverter a tarifa de 50% anunciada pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros.
Para o professor doutor em Direito Tributário André Felix Ricotta de Oliveira, sócio da Felix Ricotta Advocacia, a medida é constitucional e juridicamente viável, desde que cumpra os requisitos previstos para esse tipo de tributo. “A CIDE tem natureza extrafiscal e deve ter finalidade clara de intervir em determinada atividade econômica, seja para regulá-la, fomentá-la ou desestimulá-la. Além disso, sua arrecadação precisa ter destinação específica”, explica.
O especialista observa, porém, que a proposta traz desafios jurídicos. “Se plataformas nacionais ou de outros países que oferecem serviços de publicidade digital semelhantes ficarem de fora da cobrança, pode haver questionamento por violação ao princípio da igualdade previsto na Constituição”, alerta.
Segundo Ricotta, a tributação sobre big techs, nos moldes apresentados, é um exemplo de como a política tributária pode ser usada como ferramenta de política externa e comercial. “O desenho e o momento da proposta parecem estar mais alinhados às negociações diplomáticas do que a uma necessidade fiscal pura. Isso a torna um tema fascinante para o Direito Tributário, mas também um desafio em termos de previsibilidade e segurança jurídica”, conclui.